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9 de mai. de 2020

Fragmentos aleatórios 1


A igreja.
O som do hino tocado ao piano se espalha no salão.
Hinários fechados, momento de oração.
Todos se ajoelham, olhos fechados em prece a deus. 
A criança agarrada à mão da anciã, não obedece, reza de olhos abertos tecendo palavras nas mãos sulcadas pelo tempo corrido, vivido.
As veias azuis são rios com barquinhos a navegar entre as montanhas, a sumir no punho da camisa florida.

A porta.
A vida pedia,  tinha que partir, doía dizer aquele adeus.
A primeira partida.
Apoia-se no batente da porta, o pai sempre forte, deitado na cama, comovido ouve:
-Desculpe, eu preciso...Não posso ficar, mesmo querendo não deixá-lo, me perdoe, pai.
Ele queria e não conseguiu falar, olhos que nunca viu chorar agora libertam lágrimas silenciosas.
"Não posso ficar, nem mais um minuto com você
 sinto muito amor, mas não pode ser..."
A porta nunca se fechou.

A rede
Fala de pesca, redes, linhas e peixes.
Sobre ventos, nuvens, céus, luas e marés.
Cheiro de café se espalha perfumando as curtas falas enquanto tece a rede e arruma os anzóis e minhocas.
Antes do amanhecer vai pescar, alegrar o seu viver.
À tardinha limpa os peixes, não falta o pão.

O café
Dia de chuva, dia de sol, trabalha, nunca falta, sem saber a falta que faz.
No silêncio antes do dia clarear o galo canto, coa o café.
Antes de sair olha os filhos, ajeita as cobertas, dá um beijo na testa.
-Deus abençoe.
Deixa ao lado da cama um traço do café no copo.
O barulho da porta que se fecha.
Demora, mas à noite ela volta, cansada.
É muito esperada.


Dalva Rodrigues
09/05/2020